quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Sobre confeiteiros, cabeleireiros e as artes.

Primeiramente devo reforçar que o que vou escrever aqui é uma opinião pessoal com embasamento em nada mais do que a bibliografia da faculdade e uns dois anos de experiência de mercado. E, lógico, bagagem cultural.

O mundo tem essa ideia meio romântica de arte, como se fosse um toque mágico, divino, que algumas pessoas têm e outras invariavelmente não. Isso contrasta com um comportamento, que é clássico em sua raiz, que é quando algo é feito bem, também é arte. Por exemplo: "a arte do bom futebol", "a arte de cozinhar". Isso provém de duas fontes, a primeira, mais inconsciente, é o conceito grego de arte, techné, que basicamente significa qualquer coisa que é bem feita. A segunda é mais consciente, baseada em experiência estética (quando alguma coisa toca o seu coraçãozinho). Ela funciona de forma muito simples e associativa: se alguma coisa me faz sentir orgulho, um calorzinho no peito, é arte.

Durante muitos anos acreditou-se que design era arte. Design não é arte. Acho que isso já está claro para os profissionais de design. Design é o meio-termo entre a arte e a publicidade. O público, porém, ainda não conseguiu digerir isso muito bem. Não surpreendentemente, vemos nascer por aí os famosos pseudo-designers. Designer de bolo, designer de cabelo, designer de looks, designer de bonequinho de bisqui. Sem querer ofender os dito-cujos, nada disso é design. Design subentende algumas coisas que essas práticas, dignas o quanto sejam, não admitem. Regrinha básica: para ser "de design", algo precisa necessariamente, invariavelmente, ser projetada (palavra-chave) para a produção industrial ou produção em larga escala. Ou seja, se você fez aquele lindo e delicioso bolo à mão, na cozinha da sua casa, com os ingredientes que você comprou lá no supermercado da esquina, você não é designer, é confeiteiro. O mesmo se aplica ao "designer de cabelo", que é talvez um pouco mais absurdo. Em suma, nesse caso, parem de querer ser o que vocês não são porque vocês acham que vende mais! O que vende é a qualidade do seu produto e do seu atendimento, e não o nome estrangeiro que você não tem certeza do que é, mas parece moderninho e está na moda!

Outra vertente dessa crença sobre o vínculo design x arte está enraizado até no nosso meio. A maioria esmagadora dos clientes de design gráfico se refere às peças gráficas que ele cria como "as artes". "As artes", hoje já se tornaram um objeto tão consolidado que, certa vez, ao enviar um layout em PDF, que é um arquivo universal, para um cliente, este inocentemente mencionou que eu deveria ter feito uma confusão, que ele queria o arquivo "da arte". Depois de muita discussão descobriram-se duas coisas erradíssimas no comportamento desse cliente. 1. Ele não tinha nenhum leitor de PDF instalado no computador. 2. Ele só tinha um Corel Draw pirateado. Portanto, fiquem de olhos abertos. Mesmo vocês que trabalham no ramo. "As artes" não são os CDRs (arquivos do Corel Draw). "As artes" são objetos virtuais muito mal-nomeados pela sociedade onde existe o projeto que um designer gráfico realizou baseado no pedido do seu cliente.

Poderíamos, quem sabe, um dia, começar a espalhar o asco ao termo "as artes". Há diversas palavras para substituí-lo. Os layouts, as peças, os arquivos, até "os designs" funcionaria. E para aqueles que dizem que não se muda o que está na boca do povo, eu já lanço o seguinte caso para estudo: até pouco tempo atrás ensinava-se, nas faculdade, a diferença entre logotipo e "logomarca".

Pode ser que o leigo demore mais para aprender, mas se o mercado massivo de produção de design (gráficas, publicitários, estou olhando para vocês) começar a dar o nome certo aos bois, já é um bom primeiro passo.